Análise da Prova Discursiva para AJAA do TST – Como você se saiu?

Professor Bruno Marques

No dia 21/11/2017 (terça-feira), foi divulgado o Caderno de Questões da prova de Analista Judiciário –Área Administrativa.

O edital previa um tema relacionado com as atribuições do cargo. Porém, a FCC cobrou um tema bem aberto, sem relação direta com o cargo de analista nem com as atribuições do Tribunal Superior do Trabalho.

Vamos à análise:

Já havia alertado meus alunos a respeito do grande vilão da prova ser o TEMPO. Dito e certo! Ouvi muitos relatos de pessoas que deixaram de marcar questões ou que terminaram de marcar o gabarito e fizeram a redação correndo.

Não era para menos, uma vez que aumentaram o número de questões e diminuíram o tempo disponível para resolução da prova.

Passados o desespero e as dificuldades, vamos à análise da prova discursiva.

A opção da Banca por uma proposta mais sociológica não é nenhuma surpresa, haja vista o histórico de provas recentes. Inclusive, fiz um artigo sobre a prova discursiva do TRE/SP, que possuía um tema com nível bem parecido.

(https://voceconcursado.com.br/blog/o-que-e-prova-discursiva-modelo-de-discursiva-resolvido/)

Após demanda de alguns alunos, optei por escrever esse artigo e discorrer um pouco sobre a prova discursiva. O objetivo do artigo é responder à seguinte pergunta:

O QUE A BANCA ESPERAVA DO CANDIDATO?

O enunciado da prova discursiva era o seguinte:

TST/2017 – Analista Judiciário – Área Administrativa

Enunciado

A ameaça atual não é a passividade, mas a pseudoatividade, o impulso de “participar”, de mascarar a nulidade do que está ocorrendo. As pessoas intervêm o tempo todo, acadêmicos participam de “debates” sem sentido e assim por diante, enquanto o que é verdadeiramente difícil é dar um passo atrás, excluir-se de tudo isso.  Os que estão no poder com frequência preferem até mesmo uma participação “crítica”, um intercâmbio de qualquer tipo, ao silêncio − apenas a fim de nos envolver num “diálogo” para garantir que nossa perigosa passividade seja rompida.

(Zizek,Slavoj. Problema no Paraíso. Trad. Carlos A. Medeiros, Rio de Janeiro, Zahar, 2015)

Com base no excerto acima, desenvolva um texto dissertativo-argumentativo. Justifique seu ponto de vista.

Realmente a FCC não quis facilitar a sua vida. Veja que ela optou por NÃO inserir o tema da redação, mas tão somente o texto motivador. Essa é uma tendência da Banca, com vistas a avaliar a capacidade do candidato de encontrar o tema da redação.

Antes de começar a análise, vale a pena dar um destaque ao autor: Slavoj Zizek. Ele é um sociólogo, teórico crítico e cientista social esloveno, além de ter um conhecimento profundo de psicanálise.

Suas teorias frequentemente vão contra as análises teóricas tradicionais. Ele costuma ser politicamente incorreto e já esteve no centro de diversas polêmicas em vários círculos intelectuais. Apesar de polêmico, é muito aclamado por defensores da esquerda no Brasil.

No livro de sua autoria, intitulado “Problema no Paraíso”, a principal crítica do autor é voltada ao capitalismo global. Mas seu posicionamento é bem diferente do senso comum.

Segundo Zizek, alternativas como maior igualdade, democracia e solidariedade são consideradas ultrapassadas e fantasiosas, ou pior, nos levariam a construir uma sociedade cinzenta e supercontrolada.

E diz que se queremos realmente imaginar um caminho melhor, precisamos entender que é exatamente o capitalismo que nos oferece o mais sombrio dos futuros, servindo sempre mais do mesmo sob o disfarce de mudança constante.

CALMA! Se você não seguiu a linha de raciocínio do autor, não tem problema! O enunciado da questão traz apenas um trecho do livro dele. Com base nesse trecho, o candidato poderia direcionar a argumentação para diversos aspectos sociais sem, necessariamente, seguir a linha de pensamento dele, ok?

Pois bem, o tema da redação é: Pseudoatividade na sociedade contemporânea.

Para alguns, o problema já começou aqui:

O QUE É PSEUDOATIVIDADE?

Pseudoatividade, sociologicamente falando, é a necessidade do ser humano de “estar ativo”, de “participar” daquilo que servirá para desmascarar a vacuidade do que se sucede.

Mesmo que não soubesse o conceito, poderia retirá-lo do próprio texto motivador.

Primeiro, o autor fala da pseudoatividade como “o impulso de “participar”, de mascarar a nulidade do que está ocorrendo “.

Ademais, faz uma nova referência. Leia esse trecho:

“Os que estão no poder com frequência preferem até mesmo uma participação “crítica”, um intercâmbio de qualquer tipo, ao silêncio”

Veja que o autor faz uso do paralelismo semântico:

Passividade: “Preferem o silêncio”

Pseudoatividade: “Preferem uma participação crítica, um intercâmbio de qualquer tipo

Sendo assim, tem-se que pseudoatividade é uma participação ilusória, isto é, uma situação em que a pessoa acha que está inserida em alguma atividade, mas na verdade não está.

Acha que está construindo algo, mas no final, não está construindo nada. O resultado de toda aquela ação é nulo. Por isso, o nome: Pseudo (Falsa) atividade.

Passividade, por sua vez, pode ser entendida como a ação de acreditar que tudo o que está posto é como deveria ser e nada deve ser mudado.

Normalmente, é taxada como uma característica de algo ou de alguém que não toma iniciativa, não age ativamente e tende a obedecer sem reagir.

Pois bem, após esclarecer o que é o tema, vamos adiante na análise.

A TESE, isto é, a opinião do autor está no início do texto motivador:

A ameaça atual não é a passividade, mas a pseudoatividade (…)!”

E o autor vai além, inferindo que a passividade é mais perigosa e mais poderosa do que a pseudoatividade. Veja o trecho:

“Os que estão no poder com frequência preferem até mesmo uma participação “crítica”(…) para garantir que nossa perigosa passividade seja rompida. ”

Sendo assim, seria uma boa opção seguir a opinião do autor e “falar mal” da pseudoatividade. Pode-se defender, por exemplo, que a pseudoatividade é algo ruim, que prejudica a sociedade e a evolução social do homem.

Porém, se você optou por fazer o contrário e ser a favor da pseudoatividade, terá que apresentar fundamentos muito bons para desconstruir a opinião do autor.

QUAIS ARGUMENTOS PODERIA UTILIZAR NA PROVA SEM CAIR NO SENSO COMUM?

Um dos critérios avaliativos da FCC é a capacidade de análise e senso crítico. Apesar de se tratar de um tema relativamente simples, é muito fácil se perder na hora de elaborar a redação.

Por estar inserido no cotidiano da maioria da população, é muito difícil ir além do senso comum. Sendo assim, acredito que esse tenha sido o maior desafio da prova.

A pseudoatividade pode ser verificada em diversos aspectos da sociedade: política brasileira, relações interpessoais, relações internacionais, entre outros. São argumentos possíveis:

– Conceituação de pseudoatividade e passividade: trazer os dois conceitos e falar um pouco sobre cada um deles é uma alternativa interessante.

– A pseudoatividade no bipartidarismo político brasileiro: o candidato pode abordar os recentes acontecimentos políticos, em que a população debatia e defendia posições políticas. Por meio de lutas e manifestações por um País melhor, ambos os lados atuavam como pseudoativistas, pois, ao final, nenhum dos lados obteve uma mudança positiva significativa.

– A manipulação das massas por meio de informações inverídicas: esse é um ponto interessante para ser abordado. A população se limita a discutir e a defender aquilo que é apresentado nos meios de comunicação tradicionais. A veracidade das informações raramente é analisada. O que importa é repassar a informação, com o objetivo de justificar o seu “ponto de vista”. Defende-se que a mídia apenas repassa as informações de interesse dos poderosos, com o objetivo de dever o interesse deles. Para isso, manipula as informações, para crar um exército de pessoas agindo de acordo com os interesses dela. Esse exército é formado por praticantes da pseudoatividade.

– A pseudoatividade e sua importância para o capitalismo: em regra, o capitalismo tem por tendência moldar a realidade para satisfazer seus próprios interesses. A pseudoatividade facilita muito isso, pois, graças a ela, os poderosos capitalistas podem conquistar defensores para aos seus interesses, mesmo que em detrimento do interesse comum.

– A passividade e a pseudoatividade na hora de votar: aqui poderia ser abordada a questão do voto. Por força constitucional, o voto é obrigatório. Porém, os eleitores são obrigados a escolher entre candidatos ruins e pouco ruins. Ao escolher um lado, exerce-se na pseudoatividade. Não se discute a possibilidade de não votar ou a mudança no sistema eleitoral. Além disso, há quem defenda que o voto em branco é uma ferramenta muito forte em uma verdadeira democracia, pois é o que concede legitimidade ao governante.

– A passividade nas relações humanas e seus impactos positivos: nesse ponto, deve-se responder a seguinte pergunta: como o silêncio pode ser positivo nas relações humanas? Pode-se defender que ser passivo não é necessariamente ser conivente com tudo. Em relações pessoais, a passividade pode ser usada como meio de fortalecimento da relação. O silêncio é uma predisposição necessária para a escuta do outro, que por sua vez, é a porta para o diálogo. O candidato ainda poderia escrever exemplos de situações em que a passividade é positiva.

-Superficialidade nas discussões políticas e/ou interpessoais: à medida que somos obrigados a ter uma opinião sobre tudo, perdemos a razão em tudo. Para se discutir um tema, é necessário um conhecimento profundo sobre aquele assunto e uma visão clara de onde se quer chegar com aquele debate. Sem o conhecimento aprofundado, as discussões são superficiais e sem foco. Defender um ponto, sem necessariamente conhecer aquilo, pressupõe pseudoatividade.

– A pseudoatividade e as necessidades intrínsecas do homem social: por fim, uma estratégia interessante de prova é relacionar o tema às necessidades intrínsecas do homem. O homem social não necessita apenas viver em sociedade, mas também se sentir parte dela. Nesse sentido, ele é cobrado cotidianamente pelos diversos meios de comunicação a se posicionar a respeito dos temas polêmicos que estão a sua volta. Essa cobrança também ocorre no trabalho, em casa, na faculdade, etc. Porém, se opta por ser passivo, é punido com o afastamento. Por isso, é humanamente mais fácil ser pseudoativo que passivo.

Bom, esses são alguns dos argumentos que poderiam ser usados no seu texto. Eles estão relacionados ao tema e fogem um pouco do senso comum! Trata-se de uma lista exemplificativa, haja vista que é um assunto muito amplo.

 

UTILIZOU ALGUM ARGUMENTO DIFERENTE QUE TAMBÉM ESTARIA RELACIONADO AO TEMA DA REDAÇÃO?

Se sim, compartilhe nos comentários!

Como sabe, o espelho de correção da FCC distribui a nota em 3 critérios avaliativos: conteúdo, estrutura e expressão.

Apresentando argumentos consistentes e que estejam relacionados ao tema, tenho certeza que tirará uma boa nota no aspecto conteúdo.

E COMO VOU SABER SE FUI BEM NOS CRITÉRIOS DE ESTRUTURA E EXPRESSÃO?

 

Além da obediência às normas cultas da língua portuguesa, alguns aspectos formais deveriam ser seguidos, para que a nota não seja prejudicada:

– Dividir o texto em parágrafos de introdução (1§), desenvolvimento (2-3§) e conclusão (1§) e manter a coerência entre eles;

– Utilizar vocábulos de coesão entre os períodos e entre os parágrafos;

– Abordar um único argumento por parágrafo, todos relacionados ao Tema e a Tese;

– Obedecer às margens, ter uma letra legível e indicar corretamente os parágrafos;

– Ter utilizado entre 27-30 linhas da folha de resposta.

Espero que esse artigo tenha sido útil para você.

Como conselho, sugiro que acompanhe o concurso até o final. As provas objetivas e discursivas são apenas a primeira fase. Não menospreze os recursos. Eles fazem muita diferença e podem mudar tudo no final.

Forte abraço!

Professor: Bruno Marques

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Ieda de Oliveira
Ieda de Oliveira
6 anos atrás

Em minha redação eu abordei a ” passividade”. Me atentei a segunda parte do tema, qual seja : ” Os que estão no poder com frequência preferem até mesmo uma participação “crítica”, um intercâmbio de qualquer tipo, ao silêncio”. Fui de encontro a tese do autor e defendi que aqueles que estão no poder preferem a passividade dos governados à participação crítica destes.