CG/DF 2023 (Auditor – Finanças e Controle): Recurso da Discursiva

Professor Celso Natale

Hoje (18/04) foi divulgado o padrão de resposta preliminar da prova discursiva aplicada para o cargo de Auditor de Controle Interno do DF (Especialidade: Finanças e Controle), da CG/DF 2023.

E, na minha opinião, tanto a questão quanto o padrão possuem um problema.

Antes de começarmos a discutir, o padrão pode ser obtido aqui:

https://voceconcursado-uploads.s3.amazonaws.com/wp-content/uploads/2023/04/31230415/PADRAORESPOSTA_CARGO1_REVISADO.pdf

Nos dois primeiros quesitos (bens públicos e eficiência de Pareto), está tudo ok, alinhado com aquilo que eu e os mais consagrados autores de Economia ensinam (principalmente eles, claro).

Contudo, não podemos dizer o mesmo do terceiro item:

3 Demonstre que, em uma situação Pareto eficiente, a taxa marginal de substituição da economia é igual à soma das taxas marginais de substituição dos indivíduos. [valor: 18,00 pontos]

E qual é o problema?

O problema é que a banca usou o termo “taxa marginal de substituição da economia”, mas quis dizer “taxa marginal de transformação” (TMT). E sim, são coisas diferentes.

É a TMT que é igual à soma das taxas marginais de substituição individuais em uma situação de eficiência de Pareto.

A taxa marginal de substituição da economia SEMPRE é igual à soma das taxas marginais de substituição individuais, pois é uma tautologia, ou seja, é o mesmo que dizer que a demanda de mercado é a soma das demandas individuais, que a renda da economia é igual à soma das rendas individuais, que a área da sua casa é a soma da área dos cômodos, e por aí vai…

Já a TMT será igual à soma das TMS individuais NA SITUAÇÃO DE EFICIÊNCIA DE PARETO.

No padrão, a banca desenvolve quase perfeitamente o raciocínio da chamada condição de Samuelson. Mas, ao contrário do próprio Paul Anthony Samuelson e de todos os autores que conheço e abordaram o tema, usa “TMS da economia”, em vez de TMT.

A confusão fica clara neste trecho do padrão:

Derivando-se a equação I em relação à produção, tem-se:

IC2 ´(G) = CPP´(G)− IC1 ´(G)

O trecho que destaquei é a derivada da Curva de Possibilidades de Produção (CPP) em relação à produção total da economia, ou seja, é a inclinação da CPP. E acontece que a inclinação da CPP é a TAXA MARGINAL DE TRANSFORMAÇÃO, e só será igual à TMS da economia no equilíbrio eficiente.

Outro nome válido para a TMT seria “custo marginal relativo”, pois ela mede qual é o custo, em termos do bem privado, para produzir uma unidade adicional do bem público. Mas também não foi esse o termo usado pela banca.

Resumindo, o padrão todo se desenvolve considerando que a derivada da CPP é a TMS da economia em qualquer situação, quando isso só é verdade quando há eficiência de Pareto. A derivada da CPP é a TMT, em qualquer situação, e a TMT é igual à soma das TMS individuais (TMS de mercado).

Portanto, minha sugestão é pela anulação do item 3 da prova Discursiva ou alteração do padrão de resposta, que deveria simplesmente estabelecer algo óbvio: que a soma das partes (TMS individuais) é igual ao todo (TMS da economia), o que seria uma pena e tornaria a questão fraca, mas, pelo menos, precisa e correta.

Abaixo, bibliografia para embasar o recurso (com destaques meus), incluindo o original do próprio Samuelson, mencionado pela banca:

“The Pareto-optimal condition, which makes relative marginal social cost equal to the sum of all persons’ marginal rates of substitution, is already assured by virtue of the fact that bliss lies on the utility frontier.”

Paul A. Samuelson – The Review of Economics and Statistics – Vol. 37, No. 4 (Nov., 1955), pp. 350-356 (7 pages) Published By: The MIT Press

 

A inclinação desse conjunto de possibilidades de produção mede a taxa marginal de transformação.

Varian, Hal. Microeconomia – Uma Abordagem Moderna (p. 622). GEN Atlas. Edição do Kindle.

 

A fronteira de possibilidades de produção é côncava (curvada para dentro) — isto é, a inclinação aumenta em magnitude à medida que se produz mais alimento. Para descrevermos esse fato, definimos a taxa marginal de transformação (TMT) de alimento por vestuário como a magnitude da inclinação da fronteira em cada um dos pontos.

Pindyck, Robert; Rubinfeld, Daniel. Microeconomia (p. 608). Edição do Kindle.

 

Lembre-se de que a taxa marginal de transformação (TMT) mede a taxa pela qual um bem pode ser “transformado” em outro.

Varian, Hal. Microeconomia – Uma Abordagem Moderna (p. 625). GEN Atlas. Edição do Kindle.

 

Segue-se que a condição ótima apropriada para esse problema é que a soma dos valores absolutos das taxas marginais de substituição entre o bem privado e o bem público dos dois consumidores se iguala ao custo marginal de prover uma unidade extra do bem público:

Varian, Hal. Microeconomia – Uma Abordagem Moderna (p. 703). GEN Atlas. Edição do Kindle.

 

Vale a pena comparar a condição de eficiência do bem público à condição de eficiência do bem privado. Para um bem privado, a taxa marginal de substituição de cada pessoa tem de igualar-se ao custo marginal; para um bem público, a soma das taxas marginais de substituição tem de igualar-se ao custo marginal.

Varian, Hal. Microeconomia – Uma Abordagem Moderna (p. 704). GEN Atlas. Edição do Kindle.

 

“O bem 1 é o “numeraire” A equação III mostra a igualdade da taxa marginal de transformação, (TMT), de cada bem público, em termos do “numeraire”, não com a taxa marginal de substituição, (TMS), de cada indivíduo, como ocorre no caso de bens privados (ver equação II), mas com a soma algébrica da TMS de todos os indivíduos.”

MUELLER, Charles C. – A TEORIA DOS BENS PÚBLICOS E A ECONOMIA DO BEM-ESTAR* Disponível em: https://www.journals.usp.br/ee/article/view/143220

 

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Alexandre
Alexandre
Inscrito
1 ano atrás

Parabéns professor Celso, excelente modelo de recurso e explicação do problema.