É possível o controle Judicial dos critérios de correção de prova de concurso público?
Neste texto vamos analisar essa dúvida frequente dos candidatos.
Por George Burns e Joan Martins
O controle judicial dos critérios de correção de prova de concurso é um tema custoso para candidatos e deveras recorrente.
É habitual que as bancas de concurso, incluindo-se àquelas tidas como referência – Cebraspe, FGV e FCC, entre outras -, apesentem provas e questões mal formuladas, dúbias, com mais de uma interpretação ou resposta possível.
Até aí não haveria problema. Erros acontecem. Ocorre que as bancas, por diversas vezes, se mostram inflexíveis em corrigir o próprio erro.
As anulações de ofício, e mesmo as pleiteadas pelos candidatos, encontram grande resistência.
Essa cultura prejudica, sobremaneira, a isonomia e eficiência do concurso público.
Mas afinal, o Judiciário pode ou não intervir em critérios de formulação e correção de provas?
O Supremo Tribunal Federal – STF definiu no Tema 485 que “Os critérios adotados por banca examinadora de um concurso não podem ser revistos pelo Poder Judiciário.” (RE 632853/CE).
Contudo esse entendimento não é absoluto. Afinal, caso o fosse, teríamos uma ditadura das bancas organizadoras que poderiam se sobrepor aos critérios objetivos exigidos para realização de concursos.
Nessa toada, é firme a jurisprudência no sentido de que o controle jurisdicional de atos administrativos é excepcional. Aplicando-se ao concurso público, o Superior Tribunal de Justiça – STJ apresenta o seguinte entendimento:
“4. A jurisprudência do STJ e do STF firmou-se no sentido de que o controle jurisdicional de atos administrativos praticados em concurso público somente pode se realizar de forma excepcional, quando verificado que a Banca Examinadora transbordou os limites da legalidade. A propósito, o Tema 485/STF (RE 632.853): ‘Não compete ao Poder Judiciário substituir a banca examinadora para reexaminar o conteúdo das questões e os critérios de correção utilizados, salvo ocorrência de ilegalidade ou de inconstitucionalidade’.” [AgInt nos EDcl nos EDcl no RMS 57560/PA]
Em apertada síntese tem-se que o Judiciário não intervém em contendas relacionadas ao conteúdo das questões e seus gabaritos (correção).
A exceção dá-se em caso de ilegalidade ou inconstitucionalidade. Veja, então, que é possível pleitear mudança de gabarito, concessão de pontuação e/ou anulação de questão.
Para o reexame de questões de concurso público e de seus critérios de correção deve-se apresentar erro material de fácil constatação ou manifesta ilegalidade.
À baila de ilustrar a possibilidade a intervenção do Judiciário, podem ser questionados erro na soma da pontuação, conteúdo ou gabarito em desconformidade com lei ou com a Constituição Federal, além de ausência de observância às regras previstas no edital – conteúdo não previsto, legislação desatualizada (quando da publicação do Edital), entre outros.
Nesses casos não há valoração de questões, por parte do Judiciário, que ensejariam modificação dos critérios da banca examinadora. Ao revés.
O concurso público pressupõe o tratamento igualitário dos candidatos.
Assim, tem-se que nos casos de erro material de fácil constatação ou inequívoca ilegalidade, está-se a salvaguardar o princípio da legalidade e a própria isonomia do certame.
Exemplo de um caso concreto
Como forma de ilustrar, tem-se que o caso do concurso da Polícia Civil do Distrito Federal – PCDF, no qual um candidato entrou com Mandado de Segurança com objetivo de “modificar o gabarito ou anular Questão nº 32 da prova objetiva do concurso agente de polícia”.
Veja-se o comando da questão:
“A Ride (Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno), em seu recorte territorial, é formada por municípios de três unidades da Federação: DF, GO e MG”
Sem grande elucubração, o art. 32, caput, da Constituição Federal é cristalino ao dispor que o Distrito Federal não pode ser divido em Municípios.
Todavia, o Cebraspe considerou, como gabarito, a afirmação como “certa”, mesmo após os recursos administrativos.
Ora, o erro da banca é grosseiro.
Assim, por óbvio, o Juiz da 1ª Vara da Fazenda Pública do DF concedeu liminar determinando que “o CEBRASPE diligencie a alteração do gabarito da questão n.º 34 da prova matriz (n.º 32 do caderno de provas distribuído ao autor no momento da aplicação da prova objetiva) de “Certo” para “Errado”, até ulterior decisão judicial”.
Conclui-se, pois, que para garantir o direito líquido e certo do candidato, nessas situações, o Mandado de Segurança deve se ater a corrigir eventual ilegalidade de atos ou omissões administrativas, sem adentrar no mérito administrativo, sob pena de violação do princípio da separação dos poderes.
George Burns é professor do Você Concursado e sócio do escritório Burns & Martins.
Para mais informações: george@burnsemartins.adv.br