No dia 1o de agosto de 2002, o Estado de Santa Catarina, por meio da Secretaria de Estado da Administração, celebrou contrato de locação com Teixeira de Freitas, proprietário de uma antiga e modesta casa de alvenaria no Bairro Itacorubi, em Florianópolis, com 360 metros quadrados de área construída. No imóvel, passou a funcionar o Instituto Geral de Perícias, órgão integrante da estrutura da Secretaria de Estado da Segurança Pública. O contrato de locação continha apenas as cláusulas essenciais: a indicação das partes, o objeto da locação, a destinação, o preço, a data de pagamento, o prazo, o valor da multa por atraso. O instrumento não especificava quaisquer obrigações acessórias. O bem não estava coberto por seguro, e o contrato nada disciplinava a respeito.
Em 31 de dezembro de 2002, véspera de Ano Novo, dois indivíduos – Clóvis Bevilaqua e Velez Sarsfield, este argentino – invadiram o imóvel. Arrombando uma janela localizada nos fundos da casa, em circunstâncias ainda hoje um tanto obscuras, dominaram e imobilizaram o vigia noturno, de nome Thomas Jefferson, agente de uma empresa de vigilância que prestava serviços terceirizados. Dentro da casa, Clóvis e Velez permaneceram por duas horas. Sem sucesso, procuraram armas e munição, pensando tratar-se o local de uma Delegacia de Polícia. Na cozinha, encontraram uma garrafa ainda lacrada de cachaça Lyra, do Piauí, e a consumiram por inteiro, direto pelo gargalo. Por volta da meia noite, quando os fogos de artifício pipocavam no céu da cidade, os invasores, bêbados, frustrados e furiosos, resolveram incendiar o estabelecimento. “Vamos iluminar o Réveillon”, disse Velez a Clóvis, às gargalhadas. Do carro oficial estacionado no pátio, em cujo porta-malas haviam atirado Thomas, drenaram o tanque inteiro de gasolina. Espalharam o combustível pela casa e riscaram o palito de fósforo. Debandaram. Quando o Corpo de Bombeiros chegou, 20 minutos depois, as chamas, muito intensas, custaram a ser controladas. A operação de salvamento teve o mérito de evitar a propagação do incêndio para os prédios vizinhos, mas o imóvel ficou totalmente arruinado, inaproveitável. Oportunamente, teria que ser demolido por razões de segurança. Thomas escapou com vida, ileso.
Teixeira de Freitas, o locador, homem de muitas posses, reuniu-se em audiência com o Secretário de Estado da Administração para tratar de “seus direitos”. Deste, contudo, ouviu que, diante das circunstâncias, nada lhe era devido por parte do poder público, devendo voltar-se diretamente contra os autores do crime. Convencido da justiça das ponderações do Secretário, Teixeira de Freitas conformou-se com a perda. No terreno, construiu um edifício de apartamentos de alto padrão, com cinco pavimentos, concluído em setembro de 2006. Faleceu em 19 de julho de 2007. Em 30 de novembro de 2007, seu filho Teixeira de Freitas II, único herdeiro, 32 anos, ajuizou ação de indenização contra a Secretaria de Estado da Segurança Pública perante a Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital. Pediu: 1) o equivalente a 360 metros quadrados de área construída, considerando-se o preço do metro quadrado gasto na construção do edifício novo; 2) os aluguéis mensais desde a data do incêndio até a conclusão da obra de reconstrução; 3) 200 salários mínimos a título de dano moral infligido ao proprietário; 4) juros de mora à razão de 1% ao mês desde a data do sinistro; 5) honorários de sucumbência no percentual de 20% sobre o valor da condenação. Fundou a pretensão, em essência, na responsabilidade objetiva do Estado e, se não bastasse, na suposta ocorrência de culpa in vigilando (vigilância insuficiente e negligente, incapaz de oferecer resistência).
Ao despachar a petição em 2 de dezembro de 2007, o juiz determinou ao autor que, emendando a inicial, corrigisse a parte passiva da lide, uma vez que a Secretaria de Estado de Segurança Pública “não possui personalidade jurídica”. O advogado foi intimado em 9 de dezembro de 2007. Em conseqüência, em 20 de maio de 2008, Teixeira de Freitas II veio aos autos para indicar o Estado de Santa Catarina como réu na ação, reiterando os pedidos e o requerimento de citação. Ordenada pelo juiz, a citação foi então efetivada em 1o de junho de 2008, na pessoa do Procurador-Geral do Estado.
Em contestação, o Estado de Santa Catarina suscitou toda a matéria de defesa possível e requereu a tomada do depoimento de Thomas Jefferson como testemunha dos fatos. O juiz da causa, contudo, decidindo antecipadamente, julgou a ação improcedente, acolhendo todos os pontos da defesa e indeferindo todos os pedidos do autor. Interposta apelação, o Estado apresentou contra-razões, nas quais, além de insistir em toda a matéria de defesa, advertiu sobre a nulidade processual decorrente da ausência de instrução, em especial, da preterição do depoimento de Thomas Jefferson, postulando a aplicação do § 4º do art. 515 do Código de Processo Civil antes da conclusão do julgamento do recurso. A 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, rejeitou a tese da nulidade e reformou a sentença de primeiro grau no mérito, acolhendo os fundamentos da ação e deferindo todos os pedidos do autor. Assim sendo, o Estado foi condenado a: 1) pagar o equivalente a 360 metros quadrados de área construída, considerando-se o preço do metro quadrado gasto na construção do edifício novo; 2) os aluguéis mensais desde a data do incêndio até a conclusão da obra de reconstrução; 3) 200 salários mínimos a título de dano moral infligido ao proprietário; 4) juros de mora à razão de 1% ao mês desde a data do sinistro; 5) honorários de sucumbência no percentual de 20% sobre o valor da condenação. Houve declaração de voto vencido, que acatava, um a um, sucessivamente, todos os pontos suscitados pela defesa na contestação e nas contra-razões ao recurso de apelação.
O acórdão foi publicado no dia 1o de agosto de 2011. Na condição de Procurador do Estado vinculado ao processo, você somente recebeu a intimação da Diretoria Judiciária no dia 12 de agosto de 2011 e precisa persistir na defesa dos interesses de seu cliente.
Nesse caso, elabore a peça processual cabível para obter a reforma do julgado, datando sua peça no último dia do prazo judicial.